“Normas inconvenientes”
Publicado em 03/09/2010 pelo A Gazeta – ES.
O fato de a regulamentação do Registro de Ponto Eletrônico ter sido adiada para o próximo governo não apaga nem faz cessar sérias controvérsias.
A rejeição era inevitável. As empresas não poderiam prever o adiamento do prazo e realizaram gastos não programados.
Muitas despenderam recursos para se adaptar às normas fixadas na Portaria 1.510/09 do Ministério do Trabalho. Outras para evitar as novas regras. Foi um desassossego oneroso.
A utilização do ponto eletrônico é opcional, mas as empresas que o adotarem terão de se submeter a uma série de condições – contestáveis sob diferentes aspectos.
A Portaria 1.510/09 estabelece requisitos para o equipamento de registro de ponto, identificado pela sigla REP (Registrador Eletrônico Ponto). Ao mesmo tempo, obriga a emissão de comprovante da marcação a cada registro efetuado no REP.
A mesma portaria cria requisitos para os programas que farão o tratamento dos dados oriundos do REP e ainda determina os formatos de relatórios e arquivos digitais de registros de ponto que o empregador deverá manter e apresentar à fiscalização do trabalho – o que obriga à compra de equipamentos.
Por tudo isso, a opção pelo sistema eletrônico passou a ser uma alternativa complicada – o que é uma incoerência como espírito da informática.
Então,esse processo passou a ser evitado.
Grande número de empresas voltou a utilizar registro de ponto manual ou mecânico. Elas pagaram para involuir. Tiveram de adquirir equipamentos e treinar funcionário.
Não estão devidamente esclarecidos que motivos teriam inspirado a Portaria 1.510/09. O que não resta dúvida é que o adiamento de sua implantação demonstrou falta de firmeza na decisão do governo. Mas o recuo é menos surpreendente do que os termos da referida portaria.
Diversas instituições empresariais, como a Confederação Nacional da Indústria e a Fiesp, manifestaram preocupação pelo transtorno às empresas a partir de uma questão muito simples e antiga: o registro de ponto.
Sindicatos de trabalhadores também questionaram as novas exigências.As duas partes foram surpreendidas com a iniciativa unilateral do governo, e não se convenceram de vantagens em termos de custo-benefício. Esse tipo de dúvida,porém,não deve existir entre fabricantes de produtos REP.
Os argumentos governamentais em defesa da Portaria 1.510/09 – só apresentados após manifestações de insatisfação-, não se sustentam à luz da lógica.
O novo Registro de Ponto Eletrônico não é capaz de evitar, e nem sequer de diminuir, eventual sonegação de impostos inerentes às horas extraordinárias realizadas. É óbvio que o fato de o empregado possuir o comprovante de marcação, como quer o governo, não o impede de marcar o ponto e continuar trabalhando. O REP não é invulnerável.
Por trás do manuseio de qualquer máquina, por mais sofisticada que seja, está a vontade humana.
O REP também é politicamente inconveniente.
A premissa, embora falsa, de que a nova tecnologia de registro da jornada estaria a serviço do controle patronal sobre o trabalhador representa estopim de animosidade.
Espera-se que o adiamento da implantação da Portaria 1.510/09 seja uma saída honrosa, embora nem tanto, para a revogação.Tem vocação de matéria natimorta. Faz lembrar outro imbróglio: a obrigatoriedade de todo veículo possuir kit de primeiros socorros, instituída em 1999 e logo depois derrubada.
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